sábado, 21 de outubro de 2023

Crítica Cinema | Assassinos da Lua das Flores

(Um típico filme de Scorsese)


Como resumo do filme podem bastar duas ou três linhas: na década de 1920, no interior dos Estados Unidos, a tribo Osage descobre petróleo em suas terras. Isso dá lugar a ambição, tensões e, especialmente, uma série de crimes. Segue uma investigação do governo e do FBI. Porém, o resumo anterior contrasta com a complexidade do filme. Tudo isso é material para um romance, escrito por David Grann, e mais especificamente, serve de base para este extenso e elaborado produto de Martin Scorsese, diretor e co-roteirista.

Muito provavelmente a maioria dos espectadores de cinema sabe que quando um título é dirigido por Scorsese, significa excelência cinematográfica: aguarda-se um relato dramático, com perfis psicológicos complexos e apresentados de modo muito cuidadoso; situações tensas, às vezes até violentas; desenrolar com precisão narrativa e final acorde a todo o que vinha acontecendo.

Poucas vezes tanta popularidade está casada com tanta qualidade. E, diga-se, além de tudo o antes enumerado, ele não está sozinho para tais resultados. Grande elenco e exímios profissionais técnicos (fotógrafos, editores, músicos, etc.) o acompanham. Além disso, o orçamento, nesta oportunidade, sem chegar a ser os maiores da história do cinema, foi bem elevado (200 milhões de dólares). É significativa também a participação da conhecida empresa Apple, que planeja investir em forma pesada em cinematografia.


Basicamente, tudo já foi dito sobre este criador, começando com um dos seus trabalhos iniciais (The Big Shave, de 1967, curta-metragem onde em só 5 minutos impacta com uma virada ou aprofundamento sangrento). Nos 39 longa-metragens que dirigiu depois - alternando com outros trabalhos - abordou diversas temáticas, cristalizando as características gerais mencionadas acima. Destacamos entre seus títulos: Taxi Driver, Touro Selvagem, O Rei da Comédia, A Última Tentação de Cristo, Minha Viagem na Itália, Infiltrados, A Ilha do Medo.

Essa extensa lista de obras fez de Scorsese um dos diretores/roteiristas não apenas prolíficos mas, também, um dos mais talentosos. O último a ser exibido nas telas de São Paulo e, curiosamente, também no formato “streaming” (porque ele sempre defendeu o cinema para ser exibido em salas), foi O Irlandês - já comentado no Parsageeks em 16 de novembro de 2019 -.

Também longa é a lista de premiações obtidas, com destaque para Os Infiltrados (2006) que ganhou o Oscar como melhor filme e direção - além de edição e roteiro adaptado -. No total foram 98 premiações e 141 indicações em todas partes do mundo.


Pode resultar importante conhecer essas características e currículo profissional deste cineasta para identificar e até saborear ainda mais cada nova realização sua. Isso acontece com Os assassinos da Lua das Flores. Trata-se de um típico produto seu, onde também é co-roteirista, junto a Eric Roth (ganhador do Oscar por Forrest Gump, autor de O Curioso Caso de Benjamin Button e outras). Alguns dos adjetivos que se podem aplicar a este filme de Scorsese são: amargo, duro, violento, com personagens muito bem desenhados e representados, com situações positivas, amáveis (o amor aparece, embora as cenas românticas sejam escassas) e, outras, muito tristes (em especial uma morte absurda e que chegará nas piores circunstâncias). Não faltam alguns toques de humor e ironia, sobre-entendidos e boa margem para que o espectador presencíe situações mas, em especial, possa deduzir.

A trama pontua os vínculos que os Osage tem com a natureza e o papel que atribuem a ela. Por outra parte, certas similitudes que parecem ter com os brancos: mesmas emoções e paixões. E eventuais diferenças, como relativa inocência e menor grau de ambição.

Há elementos que, além de intensos, são densos conceitualmente: a crueldade humana, crime pelo dinheiro e poder, justiça/injustiça, patologia psicológica, tendências contraditórias dentro de cada um e na sociedade; ambição, cinismo, mentiras etc. Em modo destacado está o dinheiro que pode trazer benefícios ao ser fonte de riqueza pessoal e social mas, simultaneamente, despertador de paixões e favorecedor de tramas truculentas, sinistras, para obtê-lo.

Ao igual que aquelas realizações anteriores, esta traz tudo o antes mencionado E, com certeza, muito mais. No que se refere à linguagem cinematográfica, depois de sequências com rigorosa apresentação de personagens, locais e circunstâncias, o relato fica bem acabado, porém caminha um pouco devagar na primeira parte das três horas e 26 minutos de duração. Talvez isso possa ser atribuído a uma forte consubstanciação de Scorsese com o modo de ser e a questão aborigem que aborda.

Depois, o transcurrir ganha em ritmo e caminha com bastante exatidão para seu final. Contudo, uma das últimas sequências (onde se dita uma sentença judicial) resulta de gosto bastante duvidoso. Pode ser que historicamente tenha acontecido do jeito que está no filme, mas bordeia o ridículo. Dito de passagem, aí há um “cameo” do próprio diretor, o que já fez em várias ocasiões em sua carreira.


Com relação às interpretações, Leonardo DiCaprio mais uma vez compõe um personagem de modo inesquecível até impressionar e ficar gravado na memória do espectador, ficando à altura de seus outros grandes trabalhos (A Ilha do Medo, O lobo de Wall Street, The Revenant - ganhou o Oscar -, dentre muitos outros). Esse personagem é um indivíduo atordoado, com pressões psicológicas e animicas, em diversas e contraditórias direções.

Robert De Niro
, gigante que, desde o primeiro instante, pode ser identificado (“aí está De Niro” - pensamos -) e cria outra atuação cinematográfica impecável. Como um “tio” de certa idade que parece ser um bom indivíduo, que dá conselhos a seu jovem e briguento “sobrinho” (“não brigar”, “não falar”, “não embebedar-se”), mas também pode ser um canalha, sinistro. De Niro traça um homem com todo tipo de vínculos: algumas aproximações aos demais fazem pensar (com o personagem de DiCaprio), outras resultam emocionantes (com Minnie), a maioria são cínicas (com Mollie), autênticas extorsões (de novo com DiCaprio), etc.

Não menos interessante é a labor da atriz Lily Gladstone, com 14 longa-metragens prévias, embora não tão famosa, cumpre com um papel sóbrio, sutil e, por momentos, comovente, para além de certa frialdade, essencial na personagem.

Entretanto, as menções não param: John Lithgow e Brendan Fraser marcam presença, bem como outros menos conhecidos, mas cumprindo acertadamente seu papel, como o debutante Jason Isbell (Bill Smith, na ficção) e Talee Red (como líder da tribo Osage). Os aspectos técnicos estão, como habitualmente acontece com este diretor, em muito boas mãos: edição de Thelma Schoonmaker, fotografia do mexicano Rodrigo Prieto, música original de Robbie Robertson (os três formando parte dos times habituais de Scorsese). Como há uma ambientação muito apurada do local e dos anos de 1920, o que ajuda muito na criação da atmosfera na que tudo transcorre, deve-se dar uma menção para as equipes de Direção de Arte, Decoração do Set, maquiagem e figurino.

Não é fácil criar uma obra deste porte. Deve-se saber exatamente o objetivo artístico (no roteiro e na direção), bem como conduzir o pessoal técnico e conseguir extrair o melhor de cada ator e atriz, sejam estrelas ou não. Só grandes figuras do cinema atingem tudo isso. Scorsese, sem dúvida, é uma delas. Os Assassinos da Lua das Flores é mais um exemplo da sua enorme capacidade. Assassinos da Lua das Flores é um filme típico de Scorsese: policial, dramático, denso, perfeitamente concebido, atuado e dirigido por um mestre do cinema.


Sinopse:
Baseado em uma história real, a trama conta como, na virada do século 20, o petróleo trouxe uma fortuna para a nação Osage (Oklahoma - EUA), que se tornou um dos grupos mais ricos do mundo da noite para o dia. A riqueza desses nativos norte-americanos, imediatamente, atraiu intrusos brancos, que manipularam, extorquiram e roubaram tanto dinheiro quanto podiam antes de recorrer ao assassinato. Contado por meio do improvável romance de Ernest Burkhart (Leonardo DiCaprio) e Mollie Kyle (Lily Gladstone), "Assassinos da Lua das Flores" é uma saga épica de faroeste, onde o amor verdadeiro se cruza com uma traição indescritível. Estreia, 19 de outubro nos cinemas brasileiros pela Paramount Pictures.

Imagens para divulgação fornecidas por assessorias ou retiradas da internet 
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